2 de setembro de 2010

Onde escondemos nossa perversão?


Saiu hoje no jornal britânico Mail Online uma matéria sobre mulheres por volta de seus quarenta anos, virgens, membros da Opus Dei (uma das vertentes mais radicais da igreja católica), que durante duas horas por dia – todos os dias, prendem na coxa uma espécie de cinta com dentes que perfuram sua carne para impedi-las de pensarem em sexo. Ou, caso já estejam pensando, puni-las.
Segundo o jornalista inglês, a Opus Dei surgiu em 1928, na Espanha e hoje tem 87.000 membros espalhados pelo mundo que acreditam que qualquer um pode aspirar a santificação. Aproximadamente 30% dos membros pratica o celibato e a auto-flagelação diariamente e o jejum periodicamente.
As entrevistadas são mulheres bonitas, trabalhadoras e que crêem estar servindo a Deus com o auto-flagelo. Uma delas diz que, como vivemos em uma sociedade hedonista e materialista, é difícil imaginar que algumas pessoas aceitem se sacrificar em nome de Deus. Outra diz que ninguém acha entranho quando uma pessoa faz cooper ou jogging somente porque quer fica mais magra e que, na opinião dela, “isso é nojento”.
As três religiões monoteístas – judaísmo, islamismo e cristianismo – apresentam, de formas diferentes, a mesma promessa de uma vida pós-morte na qual nada do sofrimento humano será novamente vivido. No entanto, ainda aqui na terra, e em vida, podemos de certa forma nos redimir de nossa materialidade, portanto de nosso corpo/carne, e nos aproximar um pouco do divino nos subjugando, voluntariamente, seja por meio da mutilação, do flagelo, do jejum, da devoração de excremento e, no extremo, do suicídio.
Há, na verdade, uma relação dialética no binômio corpo – espírito. Pois, embora seja no corpo que aparecem as tentações, a redenção pode vir através dele por meio da dor. A maior parte das histórias das santas medievais passa por esta percepção de que deveriam interceder em seus corpos para se redimirem de ser mulheres logo capazes de parir. Deveriam manter o corpo maculado e oferecê-lo a Cristo.
Em seu livro “A parte obscura de nós mesmos – Uma história dos perversos”, a psicanalista Elisabeth Roudinesco narra biografias de santas na idade média que, em nome de espelharem a paixão de Cristo, comiam pus e vômitos de doentes, cobriam o corpo de fezes (como Jó), se cortavam, se flagelavam etc. Ou seja, tentavam transformar o corpo tido como abjeto em um corpo místico.
E, embora nos choque saber que muitas pessoas se impõe, voluntariamente, às maiores violações, é ainda mais difícil perceber, como diz Roudinesco, “a nossa própria negatividade, a parte obscura de nós mesmos”, nossa perversão, ou seja, aquilo que em nós se deleita com o mal e a destruição de si ou do outro.

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